A história de fuga e liberdade por trás das tranças africanas na Colômbia
Neste 25 de junho, Dia da Mulher Negra Latinoameriana e Caribenha, quero deixar uma homenagem especial às palenqueras de San Basilio, na Colômbia, e suas lindas tranças africanas.
No ano passado, 2023, mochilei por 5 meses pelo país e, então nesta viagem, tive a oportunidade de conhecer um palenque fundado em 1599 no Caribe, a 50 km de Cartagena das Índias.
Foi assim que conheci o incrível papel de luta e resistência das primeiras mulheres negras livres das Américas e a história por trás de seus penteados com tranças africanas.
O Palenque de San Basilio foi reconhecido como povo livre e autônomo em 1713, quando o trafico humano de pessoas africanas ainda corria solto e 80 anos antes da Revolução do Haiti, que inspirou uma onda de abolição em toda a América, dando ao quilombo caribenho-sulamericano o título de “Primeiro povo livre da América”.
Tranças africanas na Colômbia: um estilo ancestral
As mãos dessas habilidosas artistas fazem a cabeça das palenqueras até hoje, porque as tranças africanas nunca sairam de moda neste pedacinho da África na Colômbia.
Os elaborados emaranhados de cabelos criam figuras geométricas, mantendo vivo o estilo ancestral africano, apesar de que hoje esses penteados sejam vistos mais como uma questão puramente estética, algo original e moderno.
Embora seja difícil determinar a origem exata desse tipo de penteado, é certo que, nas tribos da África Subsaariana, ele era um importante símbolo de identidade, comunicando status social, etnia ou idade.
Foi justo nesta região, no século 16, onde europeus sequestraram pessoas africanas pra serem escravizadas nas Américas.
Os traficantes de humanos cortavam os cabelos ou até mesmo raspavam as cabeças das vítimas alegando higiene, apagando assim essas mensagens e códigos sociais.
Por isso, a história dessas tranças africanas na Colômbia revela algo muito mais significativo: um símbolo de luta pela liberdade.
Leia também: Identidade mestiça na América Latina
A construção de uma identidade afroamericana
Diante da brutalidade da escravidão, as pessoas africanas, arrancadas de suas terras e famílias, resistiram com persistência. Esta resistência, que era tanto passiva quanto ativa, moldou suas vidas e assim construiu novas identidades.
No Caribe e na América do Sul, os cimarrones, pessoas escravizadas fugitivas, desafiaram o sistema colonial, formando comunidades autônomas em assentamentos negreiros, chamados de palenques ou quilombos.
Nesses refúgios, a vida era uma constante luta pela sobrevivência e pela liberdade. A agricultura, a caça e o contrabando garantiam o sustento, enquanto a organização militar protegia os palenques dos ataques espanhóis.
A cultura africana, adaptada então ao novo ambiente, floresceu nesses espaços de resistência. Ritos, crenças e conhecimentos ancestrais foram preservados e transmitidos de geração em geração, construindo assim o que chamos de Afroamérica (uma América africanizada).
A Coroa espanhola, diante da persistência dos cimarrones, foi obrigada a negociar. Acordos foram firmados, reconhecendo, ainda que de forma limitada, a autonomia dessas comunidades. Abro um par de parenteses importante aqui: (não sem traições e emboscadas).
Os palenques, que resistiram por séculos, são hoje um legado vivo da luta por liberdade e da construção de novas sociedades.
Leia também: A cultura afrocaribenha Raizal na ilha de San Andrés
A história por trás das tranças palenqueras da Colômbia
Assim, as tranças palenqueras de San Basilio, na Colômbia, são muito mais do que um simples penteado. Elas representam um rico patrimônio cultural, carregando consigo a história da luta por liberdade.
San Basilio de Palenque, no departamento de Bolívar, a 50 km de Cartagena, é um dos mais antigos assentamentos de afrodescendentes nas Américas. Fundado em 1599 por pessoas escravizadas fugitivas, o palenque se tornou um refúgio onde a cultura africana pôde florescer em liberdade.
As tranças, nesse contexto, eram muito mais do que uma questão estética: elas eram uma forma de comunicação, de identificação e de resistência africanas na Colômbia.
Os penteados das escravizadas representavam um sistema de comunicação altamente sofisticado e estratégico que ajudariam a fundar San Basilio de Palenque.
Através de padrões intrincados e combinações específicas, elas conseguiam transmitir informações cruciais pra sobrevivência e a luta por liberdade de toda a comunidade.
Um mapa de fuga codificado nos cabelos
As mulheres africanas no Caribe da Colômbia utilizavam suas tranças como verdadeiros mapas, codificando nelas informações sobre:
- Rotas de fuga: Os caminhos pra escapar dos engenhos de açúcar e alcançar o palenque eram detalhadamente trançados nos cabelos. Através de linhas, curvas e nós, estas mulheres criavam mapas minuciosos da região, indicando rios, montanhas, e até mesmo a localização de tropas espanholas.
- Sinais de alerta: Padrões específicos alertavam sobre a presença de patrulhas, a aproximação de invasores ou a necessidade de tomar precauções.
- Mensagens secretas: As tranças africanas na Colômbia também serviam pra transmitir mensagens entre membros da comunidade, como avisos sobre reuniões, informações sobre a chegada de suprimentos ou alertas sobre possíveis traições.
Além das Mensagens: Guardando Tesouros
A versatilidade das tranças palenqueras ia além da comunicação. As mulheres escondiam pequenos objetos em seus cabelos, como:
- Sementes: Pra garantir a produção de alimentos no palenque, as mulheres escondiam sementes de plantas medicinais e alimentícias em suas tranças.
- Pequenos utensílios: Além disso, também se escondiam nos cabelos, agulhas, linha e outros objetos discretos porém úteis pra a confecção de roupas e pra realização de pequenos reparos.
Leia também: Sítio arqueológico na Colômbia conta sobre uma civilização misteriosa
A importância das tranças africanas na luta pela liberdade na Colômbia
A habilidade das mulheres palenqueras em utilizar as tranças como um sistema de comunicação e armazenamento foi fundamental pra sobrevivência e a luta por liberdade das comunidades africanas na Colômbia.
Através desse código secreto, elas conseguiam organizar a resistência. As informações transmitidas através das tranças permitiam assim coordenar ações de resistência, como sabotagens, emboscadas e fugas em massa.
Além disso, as mensagens escondidas nos penteados das palenqueras, protegiam o palenque. Assim, as mulheres alertavam sobre possíveis ataques, permitindo que a comunidade se preparasse pra defesa ou dispersão.
E, enfim, os penteados das palenqueras da Colômbia ajudaram a preservar a cultura, transmitindo então conhecimentos e tradições africanas através das tranças. Assim, estas mulheres negras latinoamericanas e caribenhas contribuíram pra preservação da identidade cultural palenquera.
Até os dias de hoje, as tranças palenqueras são um símbolo da inteligência, da criatividade e da resiliência das mulheres africanas escravizadas na Colômbia. Elas representam um legado de luta, resistência e preservação da cultura, que continua vivo até hoje em San Basilio de Palenque.
Leia mais artigos sobre a Colômbia
Incluindo Palenque de San Basilio no seu roteiro de viagem pela Colômbia
Se você conhece o UMASULAMERICANA, sabe que sou especilista em criar roteiros de viagens (especialmente imersivas) pela América do Sul.
E uma das minhas dicas mais valiosas pra uma viagem pela Colômbia é conhecer você mesma o poder da história de San Basilio de Palenque, o primeiro povo negro livre das Américas.
Em Palenque de San Basilio, você pode visitar museus comunitários, aprender sobre a história e a cultura do quilombo, conhecer sobre tradições ancestrais africanas, participar de oficinas de artesanato, assistir a apresentações de música e dança tradicionais e muito mais. Um destes museus conta a história por trás das tranças africanas das palenqueras da Colômbia.
Ao planejar viajar a Cartagena, recomendo incluir Rincón del Mar no roteiro (meu lugar preferido do Caribe colombiano), porque o Palenque de San Basilio fica entre estes dois pontos! Recomendo passar entre 1 e 3 dias. E prepare-se, minha filha, pra sentir o maior calor já sentido em terras colombianas!
Roteiro personalizado pela Colômbia
Se você me fornecer mais informações sobre o seu roteiro de viagem pela Colômbia, posso te ajudar a criar um roteiro personalizado que inclua Cartagena, Rincon del Mar, Palenque de San Basilio e outras atrações que você possa ter interesse.
Aqui neste formulário você pode me contar melhor
- Quantos dias você tem pra viajar?
- Quais são outras cidades que você pretende visitar?
- Quais são seus interesses? (História, cultura, natureza, etc.)
Em seguida, a gente marca uma videochamada e vou te recomendar não apenas os melhores lugares pra visitar, mas também dicas importantes pra te ajudar a planejar sua viagem.