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Cultura Raizal de San Andrés

Raizal, identidade étnico-cultural originária de San Andrés (que não é Colômbia)

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Estou numa longa jornada imersiva pela América Latina e, durante minha viagem na Colômbia, peguei um voo de Cartagena a San Andrés. A ideia era conhecer a ilha mais linda do Caribe colombiano, mas durante a viagem, descobri que San Andrés NÃO é Colômbia, mas sim território Raizal!

Numa conversa com um local, notei que ele dizia “os colombianos”, ou seja, não se incluia. Já me pareceu curioso. Logo em seguida, ele me contou que era voluntário num movimento ‘raizal‘. Perguntei se era um grupo nativo da ilha, foi então que ele me contou sobre a história da ilha de San Andrés e o conflito sobre a Colômbia. São as reflexões desta conversa, a melhor que tive na ilha em duas semanas, que vou compartilhar com você aqui no UMASULAMERICANA.

A origem do povo raizal e uma breve história de San Andrés

A história atual de San Andrés começou a ser desenvolvida a partir do século 17, quando os invasores britânicos decidiram se estabelecer nas ilhas que eram em grande parte ignoradas pela Espanha na região do Caribe.

Assim, os exploradores britânicos começaram a estabelecer plantações de tabaco e algodão na ilha, trazendo pessoas africanas sequestradas e traficadas pra fins escravagistas das colônias inglesas.

Dentre os crimes coloniais cometidos ali, impuseram o inglês e o cristianismo, enquanto as pessoas escravizadas mantinham suas línguas africanas. O inglês era usado na igreja e na comunicação com os brancos, mas suas línguas ancestrais prevaleciam no ambiente familiar e social entre pessoas negras. Dessa forma, houve uma fusão rápida de línguas, mesclando inglés com o ibo, o mende e o mandinga.

No entando, ao final do século 18, a Espanha passa a reconquistar as ilhas caribenhas, permitindo que ingleses se mantivessem em troca de lealdade à Coroa espanhola. Essa aliança ofereceu uma conexão da ilha com os territórios dominados por espanhóis na região da Mezoamérica.

Já em 1845, a Igreja Batista foi fundada em San Andrés e desempenhou um papel crucial na formação da cultura raizal e sendo a autoridade organizacional principal desde então. Anos depois, em 1853, a escravidão foi abolida da ilha e os senhores ingleses se foram de San Andrés com suas famílias.

Com as lutas pela libertação e independência das colônias da Espanha nas primeiras décadas do século 19, a ilha de San Andrés foi anexada à Colômbia e, assim, garantiu a soberania política sobre as ilhas.

Disputa entre Colômbia e Nicarágua pela soberania de San Andrés

Corte Internacional de Justiça colombia nicaragua San Andres
(Photo credit should read EITAN ABRAMOVICH/AFP via Getty Images)

A disputa de San Andrés é um capítulo complexo na história da América Latina. Recentemente, em 2022, a Corte Internacional de Justiça (CIJ), com sede em Haia, Holanda, emitiu uma nova decisão sobre a disputa territorial entre Colômbia e Nicarágua. Este é o capítulo mais recente da longa briga legal entre os dois países nas águas do Caribe Ocidental ao longo de séculos.

No entanto, a disputa entre a Colômbia e a Nicarágua pelo arquipélago de San Andrés, Providencia e Santa Catalina no Mar do Caribe remonta ao século 19, com raízes na colonização espanhola e em tratados subsequentes.

Em 1803, a Espanha cedeu à Colômbia (então Nova Granada) o Vice-reinado da Nova Granada, que incluía o arquipélago. A Nicarágua, que se tornou independente da Espanha em 1821, protestou contra a inclusão das ilhas no território colombiano.

No início do século 20, os países assinaram dois tratados: o Tratado Holguín-Cortés (1900) e o Tratado Esguerra-Bárcenas (1928). O primeiro reconhecia a soberania colombiana sobre as ilhas, mas deixava indefinida a posse dos bancos de Alburquerque, Bajo Nuevo e Serranilla (pequenos recifes ou atóis localizados no Caribe). O segundo confirmava a soberania colombiana sobre San Andrés, mas concedia à Nicarágua direitos de pesca em áreas adjacentes.

Em 1980, a Nicarágua denunciou o Tratado Esguerra-Bárcenas e levou a disputa à Corte Internacional de Justiça (CIJ). Em 2007, a CIJ decidiu que o tratado era válido e que a Colômbia tinha soberania sobre as ilhas, mas definiu uma zona marítima de 75 mil km² sob jurisdição da Nicarágua.

Nos anos seguintes, a Colômbia e a Nicarágua apresentaram novas petições à CIJ pra revisão da delimitação marítima. Em 2016, a Corte decidiu que a Colômbia violou os direitos da Nicarágua na zona marítima adjacente ao arquipélago.

Enfim, em 2022, a CIJ definiu a fronteira marítima final entre os países no Mar Caribe, concedendo à Nicarágua uma área marítima maior do que a inicialmente estabelecida em 2007.

No entanto, a comunidade Raizal expressou sua preocupação com o futuro da sua cultura e identidade no contexto da disputa. Ela lembrou sobre a importância de que seus direitos e interesses sejam considerados e protegidos no processo de implementação da decisão da CIJ.

A Colombianização da ilha de San Andrés

Enquanto detinha a soberania política de San Andrés, a Colômbia negligenciou a integração cultural na vida nacional durante o século 19. Assim, San Andrés e a Cultura Raizal se desenvolveu sem interferências ou influências.

Contudo, no século 20, dois fatores impulsionaram o interesse da Colômbia em integrar as ilhas à Colômbia: a Constituição de 1886 e a Separação do Panamá. Isso desencadeou numa assimilação cultural, chamada de colombianização.

A colombianização permitiu a primeira onda de imigrantes que chegaram a San Andrés com o objetivo de ocupar os principais cargos públicos, desconectados da realidade social e cultural do território. Além disso, promoveu o uso do idioma espanhol e a conversão ao catolicismo por meio de missões.

Mas o ponto crucial do processo de colombianização de San Andrés aconteceu em 1953, quando o então presidente Gustavo Rojas Pinilla declarou San Andrés como porto livre, resultando numa imigração descontrolada promovida pelo Estado.

Assim, colombianos e descendentes de árabes, aqueles que realmente se beneficiaram dessas políticas, começaram a povoar e criar negócios na ilha de San Andrés.

Em seguida, em 1959, se inaugura o aeroporto de San Andrés, que leva o nome do ex-presidente Gustavo.

Essa onda migratória, além de segregar os raizais, gerando conflitos e marginalização, levou a superpopulação de San Andrés.

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E adivinha só: ninguém nunca pediu opinião das pessoas da ilha, ignorando por completo a identidade raizal e seu estilo de vida. Foi uma decisão unilateral, sem a participação dos nativos de San Andrés.

O turismo como principal economia de San Andrés

Passeio de volta à ilha de San Andrés Colômbia

Apesar de ser o segundo principal destino turístico da Colômbia, muitos habitantes do arquipélago de San Andrés vivem sem água potável e sem sistema de esgoto. Este é um problema bastante parecido ao enfrentado por pessoas pretas e mestiças de Cartagena, o principal destino do turismo colombiano.

O turismo em San Andrés é responsável por 98% da economia da ilha. Chegam mais de um milhão de visitantes por ano, o que impacta diretamente a vida das pessoas da cultura raizal.

Se antes habitavam na ilha 10 mil raizais, com a presença de colombianas, a população de San Andrés hoje supera 120 mil pessoas. E, com a presença de turistas, esse número pode passar de 300 mil convivendo em apenas 27 km².

O dinheiro arrecadado nesse cenário turístico se concentra nas mãos de mega empresários colombianos e estrangeiros. Aos raizais, lhe restam ser apenas empregados, como acontecia na era colonial britânica.

Quem são os Raizal da Ilha de San Andrés

Povo raizal, identidade caribenha
Foto Radio Nacional de Colombia

Em meio às cristalinas, coloridas e quentinhas águas do Caribe, os Raizal resistem com sua identidade. Eles são um grupo étnico afro-caribenho do arquipélago de San Andrés, Providencia e Santa Catalina, hoje considerado parte da costa caribenha da Colômbia. As pessoas das ilhas são falantes do crioulo de San Andrés-Providencia, um dos muitos crioulos ingleses falados no Caribe.

O grupo Raizal é descendente indígena, africano, inglês, francês, holandês e espanhol, ou seja, são o resultado da mestiçagem da era colonial das ilhas. Eles têm sua própria cultura e identidade, que se refletem em sua língua, música, comida e costumes.

Idioma Crioulo Sanandresano: Uma Mistura Única

O Creole Sanandresano, ou Creole raizal, é o idioma da comunidade raizal. Resultado da influência de várias línguas, como o inglês, o espanhol e línguas africanas, ele reflete a rica mistura de culturas que moldou a ilha ao longo dos séculos. Essa língua crioula não apenas comunica, mas também conecta os raizais com suas origens e história.

Se parece um inglês, mas é bem específico! Entre eles, estão sempre falando sua língua, mas com turistas os raizal de San Andrés falam espanhol ou inglês. O espanhol foi imposto durante a colombinização.

Essa mudança na política linguística teve um impacto significativo na vida da comunidade raizal. Embora o Creole Sanandresano (crioulo) tenha continuado a ser falado e seja uma parte importante da identidade cultural dos raizais, a promoção do espanhol como língua oficial trouxe mudanças na educação, na administração pública e na interação com o governo colombiano.

Música Calipso e Reggae: Ritmos da Identidade

Os ritmos musicais do calipso e do reggae são a trilha sonora da cultura raizal. Esses gêneros musicais não só proporcionam entretenimento, mas também carregam histórias de resistência e celebração. Eles são um reflexo das lutas e triunfos da comunidade raizal ao longo do tempo.

Segundo o local raizal com quem conversei, Jamaica e outros países caribenhos influenciam mais a cultura de San Andrés que Colômbia e outros países latinos.

Aqui tem uma playlist de músicas de San Andres

San Andrés NÃO é Colômbia

San Adres, ilha do Caribe
  • A ilha está localizada no Mar do Caribe, enquanto o resto da Colômbia está localizada no continente da América do Sul.
  • O povo Raizal tem uma cultura e língua únicas, distintas do restante da Colômbia.
  • San Andrés não está integrada econômica ou politicamente com o resto da Colômbia.
  • A decisão da CIJ em 2012 concedeu à Nicarágua uma porção significativa do território marítimo circundante, o que sugere que a ilha não está inteiramente dentro das fronteiras soberanas da Colômbia.

Resistência raizal

As autoridades colombianas consideram os raizal como um dos grupos étnicos afro-colombianos no âmbito da política multicultural, seguida desde 1991.

Os Raizal, por outro lado, pedem maior autonomia pra suas ilhas e estão em desacordo com o governo colombiano em questões como direitos à terra, direitos linguísticos e preservação cultural.

Os Raizal de San Andrés são um povo resiliente que preservou sua cultura e identidade apesar de séculos de colonialismo e discriminação. Eles são uma parte importante do mosaico cultural da Colômbia e sua herança única é um bem valioso para o país.

O movimento raizal em San Andrés, do qual faz parte o cara que conheci, é formado por grupos com diferentes objetivos, possivelmente originados do grupo político Sons of the Soil (SOS), que buscava uma diferenciação positiva dos nativos nos anos 80.

Com a Constituição de 1991, o povo raizal pôde lutar por seus direitos, levando à criação de legislação especial ao arquipélago de San Andrés. No entanto, as conquistas não resolveram os problemas da ilha, levando a protestos em 1999.

Surgiu então o Archipelago Movement for Ethnic Native Self-Determination for the Archipelago of San Andrés, Providence and Kethlena (AMEN-SD), liderado por Raymond Howard.

Em 2007, o governo colombiano organizou a celebração da Independência nas Ihhas de San Andrés, Providência e Santa Catalina, mas há um resgate do 1º de agosto como dia da emancipação dos escravizados, uma data importante para o povo nativo.

As vantagens da Colômbia em ter San Andrés como departamento:

  • San Andrés é um importante destino turístico para a Colômbia e contribui significativamente pra a economia do país.
  • A ilha está estrategicamente localizada no Mar do Caribe e é importante pra a segurança nacional da Colômbia.

Viaje a San Andrés com consciência

Culturas caribenhas - Identidade Raizal de San Andres

Conforme encerro essa reflexão sobre San Andrés, quero te convidar a compreender a incrível complexidade e diversidade que nosso mundo abriga. A ilha de San Andrés, embora politicamente associada à Colômbia, transcende essas fronteiras. Ela é um testemunho vivo da resiliência da cultura raizal e da riqueza de uma história que é, ao mesmo tempo, comum e singular.

Viajar é mais do que visitar lugares; é também uma oportunidade de aprender, compartilhar e crescer. Ao reconhecer San Andrés como um território raizal, não estamos negando sua afiliação política, mas sim celebrando a maravilhosa identidade que ela abriga. Estamos lembrando a nós mesmas que cada lugar tem uma narrativa multifacetada, tecida a partir das vozes de muita gente.

À medida que continuamos explorando os confins da América Latina e Caribe, que possamos sempre nos esforçar pra ver além do óbvio, entender além do superficial e respeitar além do meramente visível. Que San Andrés, com sua cultura vibrante e história profundamente enraizada, permaneça como um lembrete inspirador de que as fronteiras são fluidas, as identidades são ricas e nossa conexão com cada lugar que tocamos é uma oportunidade de enriquecimento mútuo.

Assim, que a nossa jornada através dos mares e culturas latinas e caribenhas nos torne não apenas viajantes, mas também aprendizes e defensores da verdadeira essência de cada lugar. E que San Andrés, a ilha que desafia nossa compreensão convencional, continue a nos ensinar que as raízes da identidade são profundas e intrincadas, prontas para serem exploradas por aqueles que buscam ir além das aparências.

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